Estamos a chegar ao fim da nossa curta estadia na Tailândia. Adotamos a capital como base pois é a principal artéria de transportes para onde quer que queiramos ir. Desta vez vamos para oeste. Saímos do hotel manhã cedo para o Victory Monument para apanharmos um mini-bus para Kanchanaburi. Também há comboios, mas para uma visita de um dia apenas, perde-se muito tempo na viagem. As carrinhas, mini-bus são mais rápidas e há muita oferta. Depois duas horas chegamos a Kanchanaburi. Ao contrário da viagem que fizemos no dia anterior, desta vez parece que nem sequer chegamos a sair dos subúrbios da capital. Durante toda a viagem nunca deixamos de ver a mancha urbana.
Desembarcamos na estação de autocarros e a primeira coisa que fizemos foi ir a uma pastelaria com muito bom aspeto, coisa que já não vimos a algum tempo. Compramos diversas variedades de doces e salgados para tirar a barriga de misérias e lá fomos nós à descoberta da cidade. Seguimos para o museu central dos caminhos de ferro, “Thailand-Burma Railway Centre Museum”. A história do caminho de ferro é em parte a história desta cidade. É impossível dissociar uma coisa da outra se quisermos verdadeiramente conhecer Kanchanaburi.
O museu mais do que uma exposição é um espaço de reflexão. Com um vasto espólio informativo, conta de forma detalhada a história da linha de caminho de ferro entre a Tailândia e a antiga Birmânia (agora Myanmar) idealizada pelo império japonês durante o período da II Guerra Mundial. Construída em 1943 com uma extensão de 415 quilómetros ligava Banguecoque a Rangoon, num empreendimento que se julgava impossível para a época, tal a geografia agreste da região (floresta densa) e a falta de meios. Não fora o trabalho forçado dos prisioneiros de guerra e a linha nunca tinha chegado a existir, dai também ser conhecida como o caminho de ferro da morte, tal o elevado custo pago com vidas humanas para a sua construção. A linha original foi encerrada em 1947 após o final da guerra. Mais tarde o governo Tailandês decidiu reabrir a parte do caminho de ferro no seu território e é hoje parte integrante da rede ferroviária do país. O museu não é muito grande, mas se quisermos perder algum tempo ficamos a conhecer toda a história. Nos vários espaços pode-se ver também alguns dos materiais originais utilizados na construção, bem como modelos à escala de várias seções. Uma das salas é um modelo à escala do que seria uma enfermaria para tratar os desafortunados prisioneiros que se aleijassem ou que adoecessem, o que era muito comum devido ao elevado calor e humidade da região e consequentes doenças endémicas.
A visita ao museu termina no 1º andar onde temos um bar com vista panorâmica sobre uma das outras atrações da cidade, o cemitério dos aliados que fica no lado oposto ao museu. Não deixa de ser perturbante depois de revivermos a história dar de rosto com o trágico resultado, traduzido nas inúmeras lápides lá em baixo.
Já no cemitério cruzamo-nos com muitos turistas que entretanto vão chegando em minu-bus. Alguns, provavelmente até podem ter familiares aqui sepultados. Está um sol abrasador e as lápides perfilam-se no verde resplandecente, cuidadosamente mantido pela War Graves Commissionda Commonwealth. De acordo com os dados oficiais da comissão estão aqui sepultadas 6980 vitimas, sendo a maior parte soldados Britânicos. Para além destes, contam-se ainda entre os falecidos, soldados Australianos e Holandeses. É uma homenagem digna a esta gente que perdeu a vida tão longe de casa. Estima-se que pelo menos 100 000 pessoas tenham perdido a vida durante a construção do caminho de ferro Tailândia-Birmânia, sendo na sua maioria trabalhadores de países asiáticos vizinhos. Destes porém não se conhecem sepulturas.

A travessia da ponte mais do que um evento impressionante é acima de tudo uma experiência imersiva na história recente. A extensão original da linha contudo nunca mais seria reaberta, pois parte da linha no território de Myanmar está submersa devido a uma barragem entretanto construída. Apesar de tudo, o maior ícone desta linha de caminho de ferro continua firme e profícuo. Inicialmente construída em bambu foi destruída logo após a sua inauguração. Viria a ser reconstruída mais tarde, desta vez em ferro. Atualmente só restam os vãos exteriores curvados da ponte original que resistiu ao ataque das forças aliadas.

Para termos a experiência completa, resta-nos fazer a viagem na linha de comboio. É possível fazer a viagem de Banguecoque até Nam Tok, a cerca de 60 quilómetros de Kanchanaburi, onde a linha termina. O comboio para mesmo na estação da ponte sobre o rio Kwai e é a partir dai que vamos fazer a viagem de regresso à capital. Ninguém sabe bem a que horas chega o comboio, mas a policia de serviço junto à ponte assegura-nos que comboio vai mesmo chegar.
Fazemos tempo passeando pelas bancas de vendas. Bebo uma água de coco para refrescar, compramos um livro sobre a história do caminho de ferro e depois de algum tempo, lá chega o comboio. Desta vez é um comboio a sério que mete respeito ao entrar na ponte, nada como o comboio turístico. Circula lentamente pela linha enquanto as pessoas se vão afastando até parar na estação. Como é considerada uma linha histórica, o preço da viagem para estrangeiros é fixo, independentemente da estação em que entramos/saímos. Pagamos 100 Baht’s (3$) por pessoa, ainda assim menos do que pagamos no mini-bus.
Seguimos agora pelo percurso original idealizado pelos japoneses e ao contrário da viagem de mini-bus, agora passamos pela província profunda, atravessando imensas áreas verdes pelo caminho. A viagem de comboio apesar de lenta é sempre mais interessante. Estão constantemente a vender comida e bebida e desta vez compramos umas goiabas verdes para nos entretermos pelo caminho. Juntamos a mistura picante e temos um petisco agridoce que começamos por estranhar mas que acabamos por apreciar.

O dia seguinte foi para descansar antes de apanharmos o voo de regresso a Phnom Penh. Aproveitamos o sol para relaxar na selva urbana, desfrutando das comodidades do hotel. Por volta da hora do almoço seguimos para o aeroporto Don Mueang. Na viagem ainda conhecemos um Neozelandês que tinha passado à uns anos atrás por Portugal. Tinha estado com um amigo Inglês na zona de Lagos e gostou muito do ambiente e dos portugueses em geral. Agora seguia viagem para Phuket para ir fazer mergulho, onde ia encontrar-se com a mulher que vinha da Nova Zelândia. E é este cruzamento de povos e de gentes que continua a ser a essência de viajar.
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