Dezembro 2019, Janeiro 2020
Dia 3 – Chegada ao Kosovo
Acordamos no coração do Vale de Valbona e lá fora o prado verde está coberto de um manto fino de branco, fruto do nevão da noite. Não resisto e equipo-me para uma corrida matinal! A chaminé do Hotel Margjeka já fumega e o silêncio no exterior é encantador. Desço até ao rio, onde o curso de água é formado por muitas pedras. Como não há muita água, é possível caminhar pelo curso rio acima. Este é o ponto a partir do qual se faz a travessia de Valbona para Theth, outro parque natural do outro lado da montanha. Mas a travessia só é possível no verão e leva um dia inteiro. Normalmente os visitantes vêm de táxi de Shkoder, fazem a travessia e seguem viagem para outro destino. Hoje vou ter de ficar por este lado do vale e para já sou a única pessoa por aqui. Continuo o passeio, ora pelo rio, ora pelo bosque, sempre acompanhado pelo som da água a correr.
Regressado ao hotel, descemos para tomar o pequeno almoço. Somos os únicos hóspedes no salão, apesar de ontem termos visto mais gente no hotel. Ou já saíram todos, ou ainda estão a descansar! Servem-nos o pequeno almoço tradicional que degustamos tranquilamente enquanto apreciamos a paisagem lá fora. Por fim despedimo-nos do hotel e seguimos viagem.
Deixamos o Parque Natural do Vale de Valbona e regressamos à estrada SH22 que nos leva até à fronteira com o Kosovo. À chegada, o controlo fronteiriço manda-nos seguir. Despacham-nos rapidamente sem nos pediram para parar. Não mostramos passaportes, nada! Não sei se é pelo carro ter matrícula Albanesa, mas o que é facto é que não demos cavaco a ninguém! E assim eis-nos chegados ao Kosovo.
Temos uma grande expectativa em relação ao Kosovo. Não só pela história recente da guerra dos Balcãs, mas também pelo facto de este ser o país mais recente do mundo. O Kosovo faz parte de um conjunto de países com reconhecimento limitado, isto é, após a declaração da sua independência em 2008, passou a ser reconhecido internacionalmente apenas por alguns países. O país declarou-se unilateralmente independente da Sérvia no dia 17 de fevereiro de 2018, sendo reconhecido no dia seguinte pelos Estados Unidos e alguns países europeus, tais como a França, Portugal, Reino Unido e a Alemanha. Atualmente é reconhecido por 90 Estados-membros da ONU, mas continua sem ser reconhecido pela Rússia, Brasil ou Espanha, e o governo Sérvio reivindica o território como parte integral da Sérvia. As Nações Unidas administram o território desde 1999 através da Missão de Administração Interina das Nações Unidas no Kosovo, com a cooperação da União Europeia desde 2008.
A República do Kosovo é o país mais pequeno dos Balcãs que fez parte do império Otomano entre 1389 e 1912. Nesse ano, apesar de ser uma zona de maioria Albanesa, foi integrado na Sérvia. Com uma população estimada de 2 milhões de habitantes, é composto maioritariamente pela etnia Albanesa, que representa 92% da população. Para além desses, tem 4% de Sérvios, 2% de Bósnios e 1% de Turcos. Por isso é natural que à medida que vamos andando pela estada vemos constantemente bandeiras Albanesas penduradas nas casas. Será por isso que não nos ligaram grande importância na fronteira, já que o carro é Albanês!?
O primeiro local que vamos visitar é o Mosteiro Visoki Decani, numa pequena cidade perto da fronteira com a Albânia. O GPS leva-nos até um caminho de terra que vai piorando nos últimos metros andes de chegarmos ao destino. Decidimos deixar o carro e seguir a pé pelo bosque. O caminho está enlameado e não me parece que seja muito frequentado. Passamos por um grande edifício completamente em ruinas que não chegamos bem a perceber do que se trata. Talvez um antigo hotel ou um hospital! Não se consegue perceber, tal é o estado de degradação.
Depois de caminharmos alguns minutos pelo bosque, lá chegamos a uma estrada estreita de alcatrão que nos leva até ao mosteiro. Aqui chegados percebemos que fomos enganados pelo GPS, porque há uma estrada em condições que chega mesmo ao parque de estacionamento do complexo.
O mosteiro é guardado por militares da KFOR, a força de paz internacional liderada pela NATO. Para entrar temos de deixar o cartão de cidadão na guarita com os militares de serviço. Entregam-nos um cartão de visitante e abrem temporariamente o portão de ferro que dá acesso ao interior do complexo onde está situado o mosteiro. Visoki Decani é administrado pela igreja Ortodoxa Sérvia e está sobre a proteção da Sérvia desde 1947, designado como monumento cultural de exceção. O complexo faz parte do património mundial da UNESCO em conjunto com outros quatro edifícios religiosos, os quais estão inscritos como “Monumentos Medievais do Kosovo”. O Kosovo é um país maioritariamente muçulmano e com uma história de conflito recente, muito ligada à religião, não é de admirar a segurança reforçada nestes templos ortodoxos.
No interior do mosteiro reina o silêncio e a tranquilidade. Somos recebidos por alguns monges que circulam nos seus afazeres pelos pátios que nos cumprimentam amavelmente. O mosteiro tem vida própria para além dos visitantes. Não se trata apenas de um local religiosos de exploração turística, até porque há poucos visitantes. É explicitamente proibido tirar fotografias.
O mosteiro foi fundado no séc. XIV. Ao centro a igreja é a principal atração. A arquitetura Bizantina é constituída por cinco naves e uma Iconóstase com 3 seções, com uma cúpula de 26 metros de altura. O interior é adornado por murais em frescos até ao teto que contam com mais de 1000 pinturas. Trata-se da galeria de arte medieval mais bem preservada da região. Somos convidados ao silêncio e à contemplação artística.
De saída do mosteiro recuperamos o cartão de cidadão, despedimo-nos dos militares e voltamos ao carro pelo caminho no bosque. No regresso somos acompanhados por um cão simpático que faz questão de nos levar até ao carro.
Voltamos à estrada e seguimos para norte para a cidade de Pec. Vamos visitar o segundo monumento medieval da UNESCO, o patriarcado de Pec.
O Mosteiro do Patriarcado de Pec foi construído no séc. XIII e tornou-se a residência dos arcebispos Sérvios, mas tarde, no séc. XIV passou a ser residência do patriarcado Sérvio, os líderes religiosos da igreja ortodoxa Sérvia. A visita processa-se da mesma forma, com a guarita militar à entrada, mas desta vez podemos entrar com o carro até a um estacionamento que dá acesso à porta principal do mosteiro. Aqui são mulheres que cuidam do espaço. Somos os únicos visitantes e uma das senhoras apercebendo-se da nossa chegada, vem abrir-nos a porta da igreja. O complexo é composto por quatro igrejas, três das quais interligadas entre si. A fachada da igreja de cor vermelha realça com a envolvente natural. No interior os frescos nos muros são protegidos com a pouca luza natural que entra na igreja e as várias naves estão pintadas em tons escuros.
O mosteiro é o maior mausoléu de dignitários religiosos Sérvios, uma vez que aqui estão os restos mortais dos seus arcebispos e patriarcas.
Regressamos à estrada. O trânsito dentro das cidades é avassalador. Levamos algum tempo até chegarmos à autoestrada que nos leva a até Prizren, a segunda maior cidade do país. A cidade fica localizada nas margens do rio Prizren Bistrica e nas encostas das montanhas Šar. O hotel onde vamos ficar está localizado na parte antiga da cidade. Estacionamos o carro no estacionamento privado do hotel, mesmo junto ao nosso quarto, e vamos passear enquanto a noite cai.
O centro histórico de Prizren fica junto ao rio e as principais atrações da cidade ficam todas à distância de uma pequena caminhada. Há muito comércio, restaurantes, igrejas e mesquitas num ambiente tipicamente muçulmano.
Vamos jantar ao HYSKA, uma cadeia de restaurantes de grelhados, perto da mesquita Sinan Pasha. A experiência descreve-se numa frase em inglês: “Good local simple food!” Comemos Kofte e salsishas de borrego, tudo halal, a acompanhar com molho tártaro e o pão tradicional árabe.
Depois de jantar atravessamos o rio pela ponte antiga de pedra e subimos a avenida Adem Jashari. Esta é uma das principais artérias do trânsito no centro da cidade e ao mesmo tempo uma das principais ruas de comércio, com lojas de ambos os lados. Vamos andando até à rotunda de acesso à autoestrada M25, onde se encontra o monumento em homenagem á NATO. Antes de regressarmos paramos na pastelaria Missini Sweets que nos desperta a atenção, não só pelo aspeto da montra, mas também pelo número de gente no interior. Arranjamos uma mesa com uns sofás confortáveis e provamos os melhores doces da cidade, segundo dizem os comentários no Tripadvisor.
Índice
- Dia 1 – Tirana, Albânia
- Dia 2 – Estrada de montanha
- Dia 3 – Chegada ao Kosovo
- Dia 4 – Prizren
- Dia 5 – Pristina e Escópia (Skopje)
- Dia 6 – Escópia (Skopje), Monte Vodno, Desfiladeiro Matka
- Dia 7 – Ohrid, Lago Ohrid
- Dia 8 – Berat
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