Iceland Road Trip – Vulcão Fagradalsfjall e Lagoa Azul

Agosto 2022

Dia 10, Vulcão Fagradalsfjall

A meteorologia não nos enganou e o dia está soalheiro, conforme prometido. Saímos cedo do parque de campismo e fazemo-nos à estrada mesmo sem tomar o pequeno-almoço. Ainda temos cerca de 45 minutos até ao sítio do vulcão Fagradalsfjall. Temos de passar por Reiquejavique onde apanhamos um pouco de trânsito, mas nada que nos atrase muito. Queremos chegar cedo pois sabemos que hoje vai haver muita gente a querer chegar ao vulcão. Antes de chegarmos a Keflavík, onde fica o aeroporto, viramos para Grindavík, uma pequena cidade no sul da península de Reykjanes. Passamos mesmo ao lado da famosa lagoa azul (Blue Lagoon) o complexo termal mais famoso da Islândia e um dos mais famosos do mundo. Antes já tínhamos tentado comprar bilhetes online, mas estava tudo esgotado. É uma das principais atrações turísticas do país e por isso tem se de comprar com muito tempo de antecedência.

Chegamos ao parque de estacionamento junto à estrada N427 e já há muito movimento de veículos. Até mesmo autocarros de excursões começam a chegar para deixar os turistas. Ainda conseguimos encontrar estacionamento para as nossas caravanas! Agora, chegados ao sitio de acesso ao vulcão, tomamos o pequeno almoço descansados, enquanto os visitantes se começam a fazer ao caminho pedestre pela montanha.

O vulcão Fagradalsfjall entrou em erupção em fevereiro de 2022 e nessa altura a erupção deixou um rasto de lava que foi descendo pela montanha. Neste momento essa cratera já não está em ebulição. Mas agora recentemente, já em agosto de 2022, houve outra parte que entrou em erupção. É um vulcão muito próximo que se chama Geldingardalir, mas que na prática fica na mesmo cordilheira que o Fagradalsfjall. No fundo é como se fizessem parte da mesma família e do mesmo episódio sísmico. Portante neste momento o local que se mantém em erupção é o Geldingardalir, que fica a cerca de 6 Km de distância do sítio onde estamos. É um longo caminho de montanha até chegarmos ao vulcão em erupção.

Depois do pequeno-almoço reforçado, preparamos as mochilas com alguns mantimentos, água e proteção para a chuva. Apesar do tempo estar bom, isto aqui muda repentinamente e por isso temos de estar preparados. Seguimos pelo caminho de acesso à montanha, que nesta altura já está bastante movimentado. Já há muitos visitantes no caminho e mais parece que vamos visitar um qualquer museu famoso! Gostava de saber se todos conseguem chegar ao destino! O caminho plano passa a uma subida ingreme já para o topo da montanha. Aqui já começamos a ver o imenso rio de lava que resultou da erupção de fevereiro.  Os painéis informativos avisam para não andarmos sobre a lava porque a lava como é recente pode partir-se e por baixo ainda está muito quente. Afinal o vulcão ainda está ativo. Ainda assim, alguns mais curiosos arriscam tirar fotografias na lava. É por sua conta e risco! Como já estamos habituados aqui na Islândia, os locais de perigo estão assinalados, mas não protegidos. Ou seja, as autoridades informam dos perigos, mas depois a pessoa tem de ser responsável. Não há cá locais vedados que impeçam a passagem. Cada um que se cuide! Afinal, o país é todo ele um local de risco e quem cá vive sabe muito bem os cuidados que devem ter.

A subida é estreita e escorregadia e cada um sobre ao seu ritmo. Sempre vamos parando para apreciar a imensidão de lava que foi deixada para trás. No cimo da montanha o trilho dá lugar a uma planície de pedras e pedregulhos. Temos de caminhar por cima de pedras por cerca de 1 Km. Um verdadeiro desafio! É preciso ter muita cautela para evitar entorses. Vê-se pessoas de todas as idades a resistir à irregularidade do terreno, todos com o mesmo objetivo em mente. Não é todos os dias que se pode ver ao vivo um vulcão em erupção! Enquanto parte do grupo continua a caminhada, eu fico para trás com o Joel para lançarmos o drone por cima dos campos de lava. Do sítio onde estamos não conseguimos ver o local da erupção, mas o drone tem um alcance de 4 Km. Voamos na direção de Geldingardalir e logo deixamos de o ver. Concentramo-nos no ecrã do smartphone! Seguimos por trás da montanha e começamos a ver fumo. Prosseguimos a viagem, apesar de já estarmos quase no limite do alcance, mas como é em linha reta, o drone deve orientar-se. Eis que subitamente surge a cratera e uma grande mancha cor de laranja viva a borbulhar das suas entranhas. Primeiro aquela sensação de estarmos a assistir a um documentário da Naional Geographic no ecrã do smartphone. Só passados uns instantes é que processamos a realidade que está perante nós e a apenas alguns quilómetros mais à frente! O ecrã do smartphone é apenas um vislumbre daquilo que estamos prestes a presenciar. Dá-nos uma motivação extra para o resto do percurso. Eu apresso-me a juntar-me à Marisa, Lucy e à Nikky, para lhes transmitir um pouco de ânimo para o que aí vem. Já estamos a caminhar à quase 6 Km pela montanha e a motivação já não é o que era no início.

As pedras voltam a dar lugar a um trilho ainda em construção que faz a travessia de uma montanha para a outra, aquela onde fica o Geldingardalir. Uma mini retro-escavadora alisa o terreno o melhor que pode no meio da imensidão das pedras. Estas eram terras virgens até à bem pouco tempo, mas agora enchem-se de “peregrinos” frequentemente. As autoridades estão a preparar o terreno para facilitar as visitas ao local, pois mesmo depois de terminar a erupção, o vulcão vai continuar a ser uma das atrações naturais da Islândia.

Continuamos pelo trilho, agora ligeiramente em sentido descendente na passagem entre as montanhas, mas do vulcão, nem sinal. Nesta seção do trilho, o movimento de pessoas é cada vez maior. Para além disso anda uma máquina de um lado para o outro a carregar terra para preparar o trilho, de maneira que fique mais adequado ao fluxo de visitantes. Depois de caminharmos mais algum um tempo, começamos a avistar ao longe uma grande concentração de pessoas.  De repente … eis que surge novamente aquela mancha cor de laranja viva, mas agora está ali à minha frente e não no ecrã do smartphone! Começamos a acelerar o passo, como crianças à chegada a um parque infantil! Agora, à nossa frente está uma cratera viva com lava a borbulhar, como se de um caldeirão se tratasse. Esta é definitivamente uma poção mágica! Nunca vimos uma cor tão vívida como este laranja que sai das entranhas da terra. Penso que esta vai formar uma nova entrada no nosso alfabeto das cores: “laranja, cor de lava”, talvez … Todos nós já vimos vulcões e lava em documentários na TV, mas nunca imaginamos que ao vivo as cores fossem tão impressionantes.

Depois da cor, que nos causou o primeiro impacto, ficamos absorvidos pela constante agitação do vulcão. O ponto de observação fica no topo de uma colina, enquanto a cratera fica em baixo a uma distância segura, mais ao menos no centro de uma planície já coberta de lava solidificada. O contraste entre o escuro da lava petrificada e a lava ainda em ebulição é qualquer coisa de extraordinário. Um privilégio que temos a sorte de desfrutar nesta efeméride do tempo presente. Não é fácil conjugar o tempo e o espaço para vermos um tal fenómeno da natureza, dai termos feito um grande esforço para aqui estar.

Sentamo-nos durante algum tempo a contemplar o vulcão. É para isso que toda esta gente aqui veio. O percurso de três horas para aqui chegar não inclui o tempo de contemplação. Se quisermos podemos ficar aqui o dia todo. Não há bilhetes nem lugares reservados. Sentamos nas pedras duras e quanto mais perto queremos estar do vulcão, mais cautelosos temos de ser para não cairmos colina abaixo. O desconforto do assento é facilmente esquecido com as imagens vivas que temos à nossa frente e com o barulho avassalador que vem do interior da cratera. Parece que a terra está revoltada e esta é a forma que encontra para se expressar a nós. Quem dera que muitos outros pudessem escutar a sua revolta. Talvez mudássemos um pouco a forma como tratamos o planeta.

Lançamos novamente o drone para nos aproximarmos da cratera, mas com uma distância de segurança, não vá o “bicho” derreter com tanto calor. As imagens captadas da perspetiva aérea são um deleitoso complemento ao que estamos a assistir a olho nu. Há outros drones a voar também para captar imagens mais de perto. Para além disso, andam também vários helicópteros a sobrevoar a região, para os visitantes mais abastados. Esses não precisam de fazer a caminhada até aqui. Não tenho dúvidas de que terão uma visão impressionante do vulcão, mas não tem esta experiência de proximidade que aqui se sente. E para mim isso vale tudo. A sensação de estar tão próximo deste fenómeno vivo, de poder sentir com todos os sentidos esta experiência, não tem preço.

Após contemplarmos o espetáculo durante algum tempo e de várias perspetivas diferentes, iniciamos a viagem de regresso. Sabemos o que ainda temos pela frente, mas aquilo que acabamos de vivenciar dá-nos um animo extra para o regresso. Até mesmo a Nikky, a mais pequena do grupo, está tão impressionada com o vulcão que já nem se queixa da caminhada.

Passadas algumas horas chegamos ao parque de estacionamento. No total demoramos cerca de 5 horas para visitar os vulcões Fagradalsfjall e Geldingardalir. Mas mesmo que levássemos 10 horas, valeria a pena cada minuto desta experiência.

Voltamos a Grindavík para tomar qualquer coisa quente e definirmos a próxima etapa da viagem. Tivemos de alterar o plano original para vermos o vulcão hoje. Amanhã já dá chuva novamente e provavelmente o local estará fechado. Agora já percebemos porque é que não se pode visitar o vulcão com mau tempo. Se o caminho já é perigoso com bom tempo, imagino como serão aquelas pedras com chuva! A última etapa da nossa viagem é a península de Snaefellsnes. É uma península no oeste do Borgarfjördur, na região oeste da Islândia. É muitas vezes apelidada de Islândia em miniatura, já que em Snaefellsnes se podem encontrar muitas das paisagens islandesas. De maneira a ficarmos mais próximos da península, decidimos ir pernoitar em Akranes, uma cidade a norte de Reiquejavique.

Dia 10, Lagoa Azul

Seguimos viagem e pelo caminho, logo à saída de Grindavík, decido fazer um desvio para ir ver a famosa Lagoa Azul. Não conseguimos comprar bilhetes (aqui não é como no vulcão), mas já que estamos aqui a passar ao lado, decido ir conhecer o local. Quando estamos a chegar ao parque de estacionamos já se consegue ver partes da lagoa no exterior. Estacionamos as caravanas e vamos dar uma volta a pé. Já começou a chover para desencanto de todos, mas não quero perder a oportunidade de conhecer este local. Aqui não se pode tomar banho, nem sequer molhar os pés, com muita pena nossa. Eu e a Nikky já íamos preparados de chinelos para pôr os pés dentro de água. Depois da longa caminhada seria revigorante, mas não é possível, pelo menos é o que dizem todas as placas ao longo do percurso. A cor da água azul-turquesa e a sílica branca são características da lagoa e muito convidativas…

A chuva continua e alguns de nós refugiam-se nas caravanas. Entretanto decido ir até à entrada do complexo que está cheio de visitantes, dai a indisponibilidade dos bilhetes. Reparo que há várias filas para a entrada e uma delas é para visitantes sem bilhete, sujeito a disponibilidade. Vou tentar a sorte, pois não temos nada a perder. Depois de algum tempo de espera, lá sou chamado à receção. Explico que somos uma família que estamos a terminar as férias na Islândia, mas que não conseguimos comprar bilhetes online. O rapaz que me atende diz-me para esperar cerca de 30 minutos para ver se vem mais algum grupo de visitantes. Diz-me que o problema não é tanto a lotação da lagoa, mas sim a disponibilidade dos cacifos. Vamos aguardar os 30 minutos e ver se temos a sorte de conseguir umas entradas “last minute”.

A Lagoa Azul atrai visitantes que procuram nas suas águas quentes propriedades medicinais. São mais de 6 milhões de litros de água em 5 mil metros quadrados de área. Além do efeito relaxante das águas quentes num país frio, a concentração de algas e sais minerais é eficiente no combate ao envelhecimento e no tratamento de doenças de pele, segundo dizem. Por isso também disponibilizam uma loja de produtos de beleza e tratamento de pele com preços proibitivos para os nossos bolsos. Passeamos pelas lojas e pelo café com vista para a lagoa. Depois da longa caminhada que fizemos no vulcão, um SPA como este vinha mesmo a calhar.

Passados os 30 minutos dirigi-me novamente à receção. Desta vez é uma rapariga que nos atende, ao que parece com um cargo superior ao primeiro rapaz. Diz-nos que nos consegue arranjar entradas para todos. Música para os nossos ouvidos!!! O preço já sabemos que não é barato. Os valores online começam nos 60€ p/ pessoa, dependendo dos dias, mas é difícil encontrar entradas a esses preços. Acabamos por pagar 90€ p/ pessoa que é o valor que tínhamos visto inicialmente online para estes dias, quando ainda havia disponibilidade. Bem sei que é caro, mas é uma daquelas experiências que talvez nunca mais venhamos a repetir. É um luxo do qual podemos disfrutar, e especialmente depois de um dia tão cansativo.

Quando entramos na Lagoa Azul já o tempo mudou completamente. O sol que apanhamos durante o dia dá lugar a uma névoa com chuviscos. A água da lagoa é composta por sílica, algas (micro-algas), e sais minerais, que lhe dá todas as suas propriedades termais e medicinais. A água é captada das profundezas da terra a uma temperatura de 240ºC e quando chega à lagoa está a 38ºC. É uma mistura de água do mar geotérmica (70%) e água doce (30%). Pormenores técnicos à parte, há poucos sítios onde nos apetecesse tanto estar depois de uma longa caminhada, como este!

O contraste entre o frio que se sente fora de água e água quente é revitalizante, apesar de um pouco incómodo ao início. Sempre podemos mantermos imersos até ao pescoço e assim não apanhamos frio. Também temos direito a uma máscara de sílica para rejuvenescer a pele. A lagoa é muito grande e mesmo que esteja muita gente, não se sente grandes aglomerados porque as pessoas acabam por dispersar entre as várias zonas. As diferentes zonas estão todas conectadas por água, por isso podemos passear à vontade por todo o complexo. Ficamos a relaxar até ao anoitecer sem nos incomodarmos com o frio ou a chuva. Estas águas “curam” todos os males!

A Lagoa Azul foi uma agradável surpresa que já não estava no nosso programa, e uma recompensa extraordinária para o esforço que fizemos no caminho para o vulcão. Apesar de termos programado este dia à última hora, devido às circunstâncias meteorológicas, tudo acabou por se configurar da melhor maneira e tiramos o máximo do dia. Agora ainda temos uma hora de viagem até Akranes.

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